A riqueza da simplicidade em um mundo de complexidades vazias

Em um mundo cada vez mais acelerado, marcado por demandas constantes, excesso de informações e pressões sociais, a busca por uma vida mais simples e emocionalmente significativa tem se mostrado um caminho eficaz para a lida com os dilemas da saúde mental.

Isso vem sendo comprovado pela ciência, como aponta por exemplo um estudo publicado em 2019 (Honore, C., & Park, C. (2019). The benefits of slow living in a fast-paced world. Journal of Positive Psychology, 14(3), 245-256), o qual aponta que pessoas que priorizam relações significativas relataram níveis mais baixos de estresse e maior satisfação com a vida.

E, quando me refiro a relacionamentos, não trata-se especificamente de pessoas, mas com o mundo ao seu redor como um todo, o que inclui até mesmo os objetos. É muito mais uma questão de percepção de valor sobre o que lhe traz sentido/propósito, do que o envolvimento emocional direto com alguém.

Quanto à simplicidade, não significa abrir mão de conquistas ou viver em privação, mas sim priorizar o que realmente importa, reduzindo o excesso de preocupações, compromissos e posses que muitas vezes nos sobrecarregam.

Un pintoresco lugar de café al aire libre con una taza de café en una mesa con vistas a un hermoso paisaje | Imagen Premium generada con IA

Nesse contexto, o pensamento de Viktor Frankl, psiquiatra e criador da logoterapia, oferece uma profunda reflexão sobre o sentido da vida e como ele contrasta com as complexidades que muitas vezes se acumulam em nosso dia a dia como verdadeiras parafernálias emocionais e sociais, contribuindo para nos afastar da real felicidade.

Frankl acreditava que o principal motivador do ser humano não é o prazer pelo prazer, nem o poder, em si, mas a busca por um tipo de significado capaz de transcender ao que nós mesmos somos capazes de nomear.

Em sua obra mais conhecida, “Em Busca de Sentido”, Frankl relata as suas experiências nos campos de concentração nazistas e como, mesmo em meio ao sofrimento extremo, àqueles que encontravam um propósito conseguiam resistir e manter a sanidade mental. Isto foi, para o autor, uma prova cabal de que o sentido de vida transcende a experiência material.

Contraste

Na vida moderna, no entanto, estamos constantemente distraídos por uma infinidade de estímulos e obrigações que pouco contribuem para o que chamo aqui, propositalmente, de “riqueza da simplicidade”.

Café da manhã na cama com café, pães, flores na bandeja de madeira na cama do hotel ou em casa. Luz da janela | Foto Premium

Isso, porque, o que colocamos em evidência é a riqueza dos excessos: cultura do consumo, a pressão por produtividade e a ilusão de que a felicidade está na acumulação de bens materiais ou na conquista de status nos afastam do que realmente importa.

Isso tem se refletido até mesmo nos relacionamentos amorosos, onde o valor da relação muitas vezes é medido pelas performances, e não pela natureza real daquilo que somos enquanto pessoas comuns, onde virtudes e defeitos são faces diferentes de uma mesma moeda.

Como resultado, em vez de nos conectarmos com nossos valores mais profundos, muitas vezes nos perdemos em uma rotina frenética que nos deixa vazios e insatisfeitos, algo que frequentemente nos leva à exaustão, vindo daí o adoecimento físico e mental em muitos casos.

14 brincadeiras de rua para lembrar os velhos tempos

Desse modo, podemos pensar que a vida simples surge como uma resposta a essa desconexão das complexidades vazias para uma vida rica de simplicidades com sentido. Ressalto que isto, na prática, não tem a ver com viver nas montanhas, como alguns imaginam, mas saber olhar para dentro de si e entender o que realmente importa nesse mar de estímulos e/ou desestímulos que nos mantém acordados.

Dor como fonte

Frankl argumentava que o sentido pode ser encontrado em três principais fontes: o trabalho (ou contribuição para o mundo), os relacionamentos significativos e a capacidade de encontrar beleza e aprendizado mesmo diante do sofrimento.

Uma vida simples facilita essa conexão, e por vezes isso ocorre através da dor. É, muitas vezes, pela condição de sofrimento que nos percebemos vulneráveis e confusos o suficiente para que possamos voltar atrás no caminho das complexidades vazias, tornando a vida mais simples, porém rica, a partir do caos.

Patch Adams - O Amor é Contagioso | Portal WeMEDS

É possível dizer, com isso, que a natureza do sofrimento se mescla com a riqueza da simplicidade, porque quando aprendemos a ver sentido no caos, a própria dor se converte em propósitos que nos levam a enxergar a vida de maneira mais realista, não falseada por utopias e legalismos, mas pelo choro de quem precisa apenas de um abraço para se sentir melhor, ou de alguém que só queira um espaço ao fim da tarde num jardim qualquer.

A simplicidade da qual tratamos aqui, portanto, não é uma exaltação à mediocridade da vida, mas um confronto às complexidades vazias que uma existência sem sentido nos traz; É um apelo ao resgate do que verdadeiramente somos, precisamos e sentimos carência de ser enquanto seres humanos.

Em resumo, a vida simples não é apenas uma forma de organizar o cotidiano, mas uma maneira de resgatar o sentido da existência em um mundo que muitas vezes nos afasta dele. Em uma cultura de complexidades vazias, a riqueza da simplicidade pode ser justamente o antídoto que precisamos para preservar e promover a nossa saúde mental e, consequentemente, a felicidade.

Leia também

💬 Posso ajudar?